Se escrevesse à minha Mãe
As saudades da comida que lhe alimentam a alma
foi atenuada com um convite para ir a um restaurante chinês. Linda esfomeada
disse um entoado SIM.
Na hora combinada lá estava ela e um novo amigo,
a rumar até à China de Phnom Penh. A nossa Linda quando se deparou com
caracteres, um espaço decorado com coisas da China sentiu-se acolhida e viva.
Estava em território conhecido. Aquela é a
cultura que ela sabe, que ela reconhece.
- Estava tão maravilhada com a familiaridade,
que fiquei a olhar para as fotografias da comida nas paredes durante uns bons
dez minutos. Um tão simples pormenor, que fez toda a diferença. Estava em casa.
Não se sabe de onde, nem para onde vai, mas
sabe-se agora que parte de Linda é chinesa. Ela parece-se e veste-se à
ocidental. É esclarecida e moderna, ao bom estilo europeu. Fala várias línguas,
todas misturadas, mas lá se faz entender. Age como chinesa, e é quando se fala
da China, que ouve falar de casa. Tem já hábitos do sudoeste asiático, come arroz,
anda descalça e até já se bronzeia. O que para Linda é um milagre, visto que a
sua brancura é de assustar o Gasparzinho. Para situar, o bronze é nos braços,
por causa das suas voltas de bicicleta, de braço ao léu, num sol de um país
tropical.
- Ena, sabias que consigo ficar morena? Os meus
braços estão escuros, quando comparo com o resto corpo pareço um bolo mármore –
ligou-me ela a contar.
- Mas não quero, porque eu sou gira é com esta
minha beleza mórbida, à filme de Tim Burton... rematou à grande.
Mas a sensação de casa, de familiaridade e de
acções, vem do Grande Continente. Uma ocidental, que virou asiática de alma e
coração.
O que a faz sentir em casa, são uns bons
dumplins banhados em molho de soja, um porco com ananás, um minchi, chao min ou
chao fan.
Linda pegou no menu e tudo fez sentido. As
fotografias, os nomes, a disposição das mesas e os utensílios usados. O pequeno
prato, a tigela para o arroz, o pequenino copo de chá, a colher chinesa e os
pauzinhos.
A nossa personagem gosta tanto de usar
pauzinhos, que até na hora de cozinhar, já só lhe basta este utensílio.
- Uma profissional, dizem os meus amigos
entendidos – disse rindo.
O seu novo amigo contou-lhe que tem uma
companheira sueca, mas coreana.
- Hum? - pensei.
Ele explicou: ela nasceu na Coreia, mas foi adoptada,
ainda com meses, por um casal de suecos. A jovem cresceu na Suécia e não
conhece outro mundo. Conhece porque viajou, mas o seu país é aquele lá na Escandinávia, e não o da
Ásia.
Nascemos num país... porque os nossos pais são
de lá e aquela passa a ser a nossa terra. Somos dali... mas podemos ser de
acolá. Assim é o ser humano, espécie que se envolvida de um ambiente, inevitavelmente e inconscientemente se começa a metamorfosear, numa espécie de
osmose. O resultado é uma mescla de sentimentos e de acções.
Linda George sentiu-se em casa num restaurante
chinês. Linda George sente saudades da comida da mãe. Linda George sente
curiosidade pelo que existe.
O sentimento é ambíguo, vai connosco a saudade
do que deixamos para trás, segue connosco a excitação do que vamos encontrar –
escreveu, mais ou menos isto, Che Guevara a sua mãe, quando fez uma viagem pela
América Latina.
- Seria assim uma carta que escreveria à minha Mãe.
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